terça-feira, 3 de novembro de 2009

Um pouco de nostalgia e um bocado de reflexão

por Apoka.


Hoje, no Fórum UOL Jogos, li um tópico muito interessante. O autor dele não sabe a autoria do texto, e, com uma breve e rasa pesquisa, também não descobri quem o escreveu. Fica a dúvida: Veríssimo ou Quintana? Bem, retrata a nostalgia sobre a infância das crianças nas últimas décadas do século XX (provavelmente até a década de 70 ou 80). Antes de comentar sobre o texto, deixarei-o aí, com algumas alterações quanto à sua estrutura, para que você já possa refletir um pouco.


"(...) É dificil acreditar que estejamos vivos até hoje!


Quando éramos pequenos, viajávamos de carro, sem cintos de segurança, sem ABS e sem airbag! Os vidros de remédio ou as garrafas de refrigerantes não tinham nenhum tipo de tampinha especial nem data de validade...


E tinha também aquelas bolinhas de gude... As que vinham embaladas sem instrução de uso. A gente bebia água da chuva, da torneira e nem conhecia água engarrafada! Que horror!


A gente andava de bicicleta sem usar nenhum tipo de proteção e passávamos nossas tardes construindo nossas pipas ou nossos carrinhos de rolimã... A gente se jogava nas ladeiras e esquecia que não tinha freios, até que déssemos de cara com a calçada ou com uma árvore...  E, depois de muitos acidentes de percurso, aprendíamos a resolver o problema... SOZINHOS!


Nas férias, saíamos de casa de manhã e brincávamos o dia todo; nossos pais às vezes não sabiam exatamente onde estávamos, mas sabiam que não estávamos em perigo.


Não existiam os celulares! Incrível! A gente procurava encrenca. Quantos machucados, ossos quebrados e dentes moles dos tombos! Ninguém denunciava ninguém... Eram só "acidentes" de moleques: na verdade,
nunca encontrávamos um culpado.


Você lembra destes incidentes: janelas quebradas, jardins destruídos, as bolas que caíam no terreno do vizinho? Existiam as brigas e, às vezes, muitos pontos roxos...  E mesmo que nos machucássemos e tantas vezes chorássemos, passava rápido; na maioria das vezes, nem mesmo nossos pais vinham a descobrir...


A gente comia muito doce, pão com muita manteiga... Mas ninguém era obeso... No máximo, um gordinho saudável... Nem se falava em colesterol... A gente dividia uma garrafa de suco, refrigerante ou até uma cerveja escondida, em três ou quatro moleques, e ninguém morreu por causa de vermes!


Não existia o Playstation, nem o Nintendo... Não tinha TV a cabo, nem videocassete, nem computador, nem Internet... Tínhamos, simplesmente, amigos! A gente andava de bicicleta ou a pé.  Íamos à casa dos amigos, tocávamos a campainha, entrávamos e conversávamos...


Sozinhos, num mundo frio e cruel... sem nenhum controle! Como sobrevivemos?


Inventávamos jogos com pedras, feijões ou cartas... Brincávamos com pequenos monstros: lesmas, caramujos e outros animaizinhos, mesmo se nossos pais nos dissessem para não fazer isso! Os nossos estômagos nunca se encheram de bichos estranhos! No máximo, tomamos algum tipo de xarope contra vermes e outros monstros destruidores... aquele cara com um peixe nas costas... (um tal de óleo de rícino).


Alguns estudantes não eram tão inteligentes quanto os outros, e tiveram que refazer a segunda série... Que horror! Não se mudava as notas e ninguém passava de ano, mesmo não passando. As professoras eram insuportáveis! Não davam moleza... Os maiores problemas na escola eram: chegar trasado, mastigar chicletes na classe ou mandar bilhetinhos falando mal da professora, correr demais no recreio ou matar aula só pra ficar jogando bola no campinho...


As nossas iniciativas eram "nossas", mas as consequências também! Ninguém se escondia atrás do outro...


Os nossos pais eram sempre do lado da lei quando transgredíamos a regras! Se nos comportávamos mal, nossos pais nos colocavam de castigo e, incrivelmente, nenhum deles foi preso por isso!


Sabíamos que quando os pais diziam "não", era "N-Ã-O". A gente ganhava brinquedos no Natal ou no aniversário, não todas as vezes que ia ao supermercado... Nossos pais nos davam presentes por amor, nunca por culpa... Por incrível que pareça, nossas vidas não se arruinaram porque não ganhamos tudo o que gostaríamos, que queríamos...


Essa geração produziu muitos inventores, artistas, amantes do risco e ótimos "solucionadores" de problemas... Nos últimos 50 anos, houve uma desmedida explosão de inovações, tendências... Tínhamos liberdade, sucessos, algumas vezes problemas e desilusões, mas tínhamos muita responsabilidade... E não é que aprendemos a resolver tudo? E sozinhos... (...)"


Pois é. Isso me fez refletir um pouco sobre como foi saudável a minha infância, mesmo bastante diferente da retratada no texto. Aliás, relatando deveras superficialmente esse período da minha vida, não tive toda a liberdade do mundo, aliás, quase o contrário: tive muita superproteção; por exemplo, não poder andar de bicicleta porque o "brinquedo" era caro na época e eu poderia me machucar, ou não poder brincar na rua porque eu poderia pegar alguma virose ou infecção ou me sujar demais.


Enfim, parece saudosismo, mas não minto que vejo a infância das crianças de atualmente algo extremamente negativo (com exceção da enorme gama de informações disponíveis e acessíveis). Devido à falta de tempo e de amor dos pais para com os filhos, criou-se muita negligência e falta de responsabilidade na criação deles. O incentivo à criatividade e imaginação e uma relação afetiva regada ao ensino de tantos valores foi trocada por algo completamente superficial e envernizado. Os carrinhos foram trocados por celulares, uma comunicação muito mais próxima e socialmente saudável foi trocada pelas janelas de chat e IM (daí fica a minha hipocrisia, afinal, este blog é formado justamente por vários amigos que se reunem diariamente em um canal de IRC), os almoços e jantares em família foram trocados pelo jornal local e pelo Jornal Nacional, e as velhas brincadeiras foram trocadas pelos jogos eletrônicos.


Isso tudo, sim, é um horror. Apesar de hoje estar dissolvido nessa dura realidade, pergunto-me: aonde foi aquele nosso lado humano, que parece ter morrido na virada do milênio; se as crianças de amanhã abrirão os olhos e perceberão o verdadeiro significado de vivenciar uma infância, de ter uma família e de aprender a conviver em sociedade. É... os tempos são difíceis, e não é só para quem passa fome ou não tem onde dormir. O amanhã é um grande mistério.

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